Livros de Areia

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Os dez por cento

Pode parecer um paradoxo, vindo de pequeníssimos editores, mas daqui nunca saiu uma crítica à FNAC. Pelo contrário. Foi graças ao interesse da FNAC que pudemos afirmar-nos. Ao contrário de outra(s) cadeia(s), a FNAC nunca nos fechou a porta e foi deles – com o argumento da qualidade reconhecida pelos insistentes pedidos de livros nossos aos seus balcões – que partiu o convite para que passássemos a ser fornecedores a conta firme e já não apenas remetentes de consignações (ao contrário de outras cadeias onde nos foi sempre barrada a entrada, sendo precisamente essa insistência dos pedidos ao balcão que virou a situação – o que era "impossível" e que dava direito a fim de conversa telefónica, passou, por milagre, a ser... possível). Foi essa elasticidade de processos que frequentemente elogiámos e que vimos expressa nas amabilíssimas recepções que tínhamos aos nossos pedidos de apresentações (pelas quais nunca nos pediram qualquer contrapartida, e de que guardamos memórias muito boas). Além disso, a FNAC encomendava com generosidade as novidades e pagava a horas (em 2006 isso era RARO). É, pois, essa FNAC que continuamos a louvar, a mesma onde, de forma improvisada e graciosa, alguns livreiros recomendaram livros nossos a leitores que no-lo comunicaram posteriormente (o Fernando Alvim foi um deles, a quem foi recomendado o Chance na livraria do Chiado).
Sinais de uma certa mudança começaram a chegar-nos em 2007, sobretudo pela redução dos pedidos de novidades. Outros e mais preocupantes ecos chegaram mais recentemente, e, aí, tenho de confessar que me enganei: se de facto as coisas vão mudar para o que parecem estar a mudar, então aquilo que eu esperei e julguei que acontecesse, que a FNAC contagiasse o restante mercado de oferta com a mesma abertura a pequenos fornecedores, limpando a sufocante imagem de reservatórios de best-sellers à boca das livrarias e outras áreas da concorrência (nunca lá nos disseram, como numa conversa com o comprador de uma grande superfície, "vocês têm algum livro que venda tanto como o Harry Potter?") pode mesmo não se concretizar. No preciso momento em que a FNAC sente chegada a ansiada liderança, começa a cortar com o que a fazia ser uma referência. Note-se que pouco me importa o fim dos 10% nos PVP (como editor, é-me benéfico, e como comprador não me afecta pois sou cada vez mais cliente do carteiro como livreiro ao domicílio). O me inquieta é o iminente fim de outras coisas, cuja percentagem na existência de um pequeno editor é de bem maior monta.
(PM)

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4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Então e se a LdA pedisse à sua distribuidora que se fosse apresentar às LI? É que há LI que não conhecem a vossa distribuidora. E depois queixam-se de ficarem com as calças na mão quando a fnac muda a estratégia, tal a vossa dependência dela.

8:36 da tarde  
Blogger LdA said...

E que LIs é que não conhecem a nossa distribuidora? Pode indicá-la(s), caro auto-imposto PR das LI? Trata-se da Pó dos Livros, da Livro do Dia, da Centésima, da Ler Devagar? Essas conhecem-nos bem,e há muito tempo. Será outra? A nossa "dependência" é de livrarias que servem bem, pagam a horas e que cumprem, genericamente, o seu papel, caro PR, e apenas dessas, sejam FNAC, LI ou outras.

Se quiser passar essa sua indignação à nossa distribuidora, pode usar os contactos que temos no blogue, e se os tiver onde e como os deve (independentes ou não), terá a bondade de não se cobrir sob o anonimato. Que lhe parece?

Atenciosamente,

Livros de Areia

1:56 da manhã  
Blogger Alvaro said...

Independentemente dos comentários anteriores – sim, é mau o anonimato, mas, bolas, a resposta foi um pouco áspera não? –, estou basicamente de acordo com a vossa posição. É mais grave que a FNAC deixe cair outras coisas do que os 10%. E pode até ser uma oportunidade para certas livrarias, independentes ou dependentes, não sei, apanharem os leitores que, é certo, não vão gostar de se ver privados dessas outras coisas, como a diversidade e um (mesmo que pequeno) espaço para a diferença. Mas era bom que essas livrarias – e aí, como editor tenho de sublinhar o que dizem – respeitassem um pouco mais os seus fornecedores.

O mercado pode ser lixado, mas a verdade é que um livreiro tem condições de excepção na compra de livros, que inclui direito de devolução, quando não consignação, o que diminui o risco para quase zero, não é? E se os prazos de pagamento não são cumpridos, a quem se deve? São os clientes que não pagam quando levam o livro da loja?

5:37 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Parece-me que o Anónimo lá de cima levanta ainda um outro problema assaz pertinente: o da perfeita indigência cultural de alguns livreiros, com maior gravidade quando essa indigência se reflecte naquilo que devia ser o seu negócio: os livros.

O mesmo é dizer: não credito que qualquer das LI necessite de ser contactada por qualquer distribuidor para obter os livros de uma editora, seja ela qual for.

Mas, infelizmente, é cada vez mais verdade que os livreiros percebem cada vez menos de livros. Vendessem sapatos, ou gravatas, e o resultado seria o mesmo. Que é feito daquelas livrarias (LI?), onde o livro era um prazer, a visita uma descoberta, e as montras um desafio?

Bom, por qualquer motivo a FNAC se tornou preponderante... Pena é que pareça estar a ficar igual aos outros... Mas Portugal é mesmo isso: "love it or leave it", e quem não pode abalar tem que o gramar.

Continuem com o bom trabalho,

Daniel

12:05 da tarde  

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