No forno: A Sereia de Curitiba
"Esmeraldas, sedas, ídolos de ouro – estão a caminho! – rubis, prata, açafrão, vinhos raros de velhas vinhas – aproximam-se! – papagaios, turquesas, âmbar, pérolas, baunilha – prestes a chegar!
Estas são as cargas que queremos na nossa ilha.
Marfim, jade, safiras, vestidos de cetim, chinelas orientais, papagaios, pimentas, jaspes, chocolate, couves…
Couves?! Quem pediu isso???
Falem, antes que perca a cabeça. Ah, foste tu, meu querido leitor! Mas que te deu para ordenares o envio de couves para o nosso fragmento de paraíso? Estrangeiros dizem que parte do céu quebrou-se e aterrou no oceano, e em dias como este, com o sol quente, a brisa fresca, a música da espuma nos meus ouvidos e raparigas bonitas a passearem na areia quente a abanarem as ancas, posso acreditar nisso. Mas tu não vives aqui. Não tens o direito de apresentar couves.
Por falar em apresentações, não podemos conhecer-nos formalmente um ao outro fora de portas, num sítio onde os únicos nomes que são trocados são os de amantes. Entra na minha casa. Fecha a porta de cana atrás de ti e senta-te. Odeio couves. Não existe nada de romântico nelas.
Enquanto falas, vou afinar a minha guitarra.
É verdade que me insinuei nesta história e enviei-vos couves. É o que merecem, sua cambada preguiçosa de hedonistas. Aqui estou eu, preso em (inserir nome de cidade) com toda a sujidade e tráfico, enquanto vocês dançam pelas noites fora a fazerem todo o tipo de coisas sensuais, como espremerem pêssegos nos corpos uns dos outros. Não é justo e não tenciono aturar isso. Mal vi o título desta história, adivinhei o que estava para vir e decidi fazer qualquer coisa sobre isso antes que começasse. As couves são ficcionais, por isso, não tenho que pagar por elas. Mas o que irão vocês fazer com elas, quando forem descarregadas por esse galeão esplêndido? Vão deixá-las apodrecer numa pilha no cais, aposto. Farão o vosso melhor para ignorá-las, mas não irão desaparecer.
E chega deste disparate de “querido leitor”. Não há nada de querido sobre mim. Tenciono ser reles a partir de agora, o mais reles possível que conseguir ser, e isso é uma outra forma como tenciono arruinar o vosso paraíso vistoso. Arrebatamento terno num clima aromático, fazer amor nas ondas e comer cocos? Pah! Cheguei à idade de (escrever em lápis para que possa ser alterado mais tarde) e nunca fiz isso ainda, logo, não vejo razão porque tenho que me sentar aqui, submisso, e ler sobre isto, sem me infiltrar. Nem pensar! Você esperava realmente aparecer e não fazer os seus leitores invejosos? É assim tão estúpido? Porque se não é, então queria deliberadamente magoar-nos, e nunca nenhum simplório irá ser eleito como Chefe da Ilha do Beijo Picante.
O que significa que tem mau carácter, a obter prazer das frustrações dos outros. Excita-o saber que somos miseráveis? Fá-lo sentir-se especial? E não pense que vou perder o meu fôlego para que possa voltar à sua história. Quando me sentir cansado ou precisar de uma pausa, copio outro documento para aqui, tenho muitos por onde escolher, tudo serve para o manter fora da página. Não sou exigente. Permiti que o início fosse contado porque quero que os leitores que vierem depois de mim saibam que você existe e que estou a ter a minha vingança. Se eu tivesse usurpado a história desde a primeira palavra, não estaria ali de todo, e as pessoas assumiriam que esta história pertencia-me por direito e o título seria incongruente, tendo que ser alterado. É melhor assim. Agora toda a gente sabe que estou a falar consigo."
("Cultos de carga na Ilha do Beijo Picante", in A Sereia de Curitiba de Rhys Hughes, tradução de Safaa Dib)
Estas são as cargas que queremos na nossa ilha.
Marfim, jade, safiras, vestidos de cetim, chinelas orientais, papagaios, pimentas, jaspes, chocolate, couves…
Couves?! Quem pediu isso???
Falem, antes que perca a cabeça. Ah, foste tu, meu querido leitor! Mas que te deu para ordenares o envio de couves para o nosso fragmento de paraíso? Estrangeiros dizem que parte do céu quebrou-se e aterrou no oceano, e em dias como este, com o sol quente, a brisa fresca, a música da espuma nos meus ouvidos e raparigas bonitas a passearem na areia quente a abanarem as ancas, posso acreditar nisso. Mas tu não vives aqui. Não tens o direito de apresentar couves.
Por falar em apresentações, não podemos conhecer-nos formalmente um ao outro fora de portas, num sítio onde os únicos nomes que são trocados são os de amantes. Entra na minha casa. Fecha a porta de cana atrás de ti e senta-te. Odeio couves. Não existe nada de romântico nelas.
Enquanto falas, vou afinar a minha guitarra.
É verdade que me insinuei nesta história e enviei-vos couves. É o que merecem, sua cambada preguiçosa de hedonistas. Aqui estou eu, preso em (inserir nome de cidade) com toda a sujidade e tráfico, enquanto vocês dançam pelas noites fora a fazerem todo o tipo de coisas sensuais, como espremerem pêssegos nos corpos uns dos outros. Não é justo e não tenciono aturar isso. Mal vi o título desta história, adivinhei o que estava para vir e decidi fazer qualquer coisa sobre isso antes que começasse. As couves são ficcionais, por isso, não tenho que pagar por elas. Mas o que irão vocês fazer com elas, quando forem descarregadas por esse galeão esplêndido? Vão deixá-las apodrecer numa pilha no cais, aposto. Farão o vosso melhor para ignorá-las, mas não irão desaparecer.
E chega deste disparate de “querido leitor”. Não há nada de querido sobre mim. Tenciono ser reles a partir de agora, o mais reles possível que conseguir ser, e isso é uma outra forma como tenciono arruinar o vosso paraíso vistoso. Arrebatamento terno num clima aromático, fazer amor nas ondas e comer cocos? Pah! Cheguei à idade de (escrever em lápis para que possa ser alterado mais tarde) e nunca fiz isso ainda, logo, não vejo razão porque tenho que me sentar aqui, submisso, e ler sobre isto, sem me infiltrar. Nem pensar! Você esperava realmente aparecer e não fazer os seus leitores invejosos? É assim tão estúpido? Porque se não é, então queria deliberadamente magoar-nos, e nunca nenhum simplório irá ser eleito como Chefe da Ilha do Beijo Picante.
O que significa que tem mau carácter, a obter prazer das frustrações dos outros. Excita-o saber que somos miseráveis? Fá-lo sentir-se especial? E não pense que vou perder o meu fôlego para que possa voltar à sua história. Quando me sentir cansado ou precisar de uma pausa, copio outro documento para aqui, tenho muitos por onde escolher, tudo serve para o manter fora da página. Não sou exigente. Permiti que o início fosse contado porque quero que os leitores que vierem depois de mim saibam que você existe e que estou a ter a minha vingança. Se eu tivesse usurpado a história desde a primeira palavra, não estaria ali de todo, e as pessoas assumiriam que esta história pertencia-me por direito e o título seria incongruente, tendo que ser alterado. É melhor assim. Agora toda a gente sabe que estou a falar consigo."
("Cultos de carga na Ilha do Beijo Picante", in A Sereia de Curitiba de Rhys Hughes, tradução de Safaa Dib)
1 Comments:
HUMMM... ESSA ILHA REALMENTE ME PARECE UM PEDAÇO DE PARAÍSO!
ALREADY MISS THIS MAGIC PLACE! :-)
SO SWEET!!! JUST LOVED IT!
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